1 - SÃO BERNARDO → GRACILIANO RAMOS
Paulo Honório era um pobre homem do sertão. Aprendera a ler
na cadeia quando o companheiro de cela lhe ensinou usando a bíblia. Trabalhara
na enxada e, depois da prisão, queria ganhar dinheiro, não pensava mais na mulher
que lhe causara a prisão, aprendeu matemática para não ser roubado. Percorria o
sertão fazendo pequenos negócios. De alguns lugares partiu para não voltar
devido a malandragens das negociatas. Instalou-se em Alagoas, planejava tomar
pra si a terra onde trabalhara na enxada. O ex-patrão vivera em economias para
fazer do filho, Luís, doutor; acabou morrendo e o filho não seguiu a profissão.
Paulo se vez amigo dele e em pouco tempo já tinha lhe emprestado dinheiro, a
propriedade estava um lixo. Luís não tinha como pagar a dívida e foi assim que,
para quitá-la, Paulo o fez entregar as terras de São Bernardo a ele. Logo teve
problemas com o vizinho Mendonça que teimava em andar com os limites de sua
terra. Porém, logo ele morreu e novas fronteiras foram estabelecidas. Paulo
iniciara vários projetos nas suas terras. Tinha a mineração, as galinhas, o
gado, as terras cultivadas. Tornara-se um homem importante. Tinha influência e
emprestava dinheiro. Certa vez, justamente por recusar um empréstimo, teve no
jornal uma nota o chamando de assassino, uma insinuação à morte de Mendonça.
Paulo reagiu com agressividade, pois não tinha nada a ver com o fato, depois
tudo foi apaziguado. Com a visita de um governador a São Bernardo e seus
questionamentos acerca do por que da ausência de uma escola nas terras, Paulo
mandou que uma fosse erguida e Luís foi contratado como professor. Recebia
muito pouco, mas Paulo não tratava bem seus empregados, muito menos se
preocupava com salários justos. Depois de certo tempo veio nele a ideia de se
casar. Era preciso ter um herdeiro. Foi assim que cortejou Madalena, uma
professora da escola normal. O casamento nunca correu bem. Junto com Madalena
veio sua tia, Madalena tinha ideia de certa forma socialista. Paulo, no
entanto, era autoritário e não se interessava pela pobreza dos trabalhadores.
Madalena engravidou e teve um menino. A pobre criança não era amada pelos pais
e vivia solta na fazenda. Nesse tempo um ciúme cegou Paulo que acreditava que a
esposa mantinha casos com todos os homens. Ao mesmo tempo se sentia um bruto
impossível de ser amado por ela. A situação se tornou tensa dentro da casa. Ele
detestava a tia de Madalena e muitas vezes ela dormia a chorar. Já Paulo
passava as noites em claro em meio a suas dúvidas. Foi nesse contexto que
Madalena acabou se suicidando. Daí para frente as coisas desandaram na fazenda.
A tia de Madalena resolveu ir embora e Paulo deu a ela os ordenados que ficara
devendo a sua esposa. Logo as produções feitas em São Bernardo perderam o
valor. A pedreira estava fechada há um bom tempo, os bens cultivados não eram
colhidos, pois não valia a pena o trabalho de colhê-los para depois vender ao
preço absurdo que se achava na hora da venda. E os animais que eram criados
morriam e se escasseavam aos poucos. Paulo Honório ficou então a terminar de
escrever o livro que iniciara onde narrava a sua vida, não tendo nem mesmo o
filho, já que por ele não tinha amor.
CONTINUI LENDO
2 - VIDAS SECAS → GRACILIANO RAMOS
Com a chegada da seca no sertão, Fabiano e sua esposa Sinhá
Vitória, os dois filhos, o papagaio e a cachorra Baleia foram forçados a mudar.
Caminharam por uma longa jornada na terrível seca. Antes que morressem de fome
comeram o papagaio, seguindo a viagem o menino mais velho desmaiou, seguiram
carregando o pequeno, foi assim que encontraram uma fazenda abandonada onde se
instalaram. A seca acabou e Fabiano se acertou com o dono da fazenda. Era o
vaqueiro daquela terra, logo houve uma ressurreição em todos e tudo. Os
meninos, a cadela, Sinhá Vitória e o próprio Fabiano engordaram, na fazenda
criaram porcos e bois.
Em um dia Fabiano foi até a cidade comprar o que faltava em
casa, antes de ir embora resolveu tomar um copo de cachaça, se sentia por todos
enganado acreditando que sempre lhe cobravam mais do que era certo, assim como
o patrão que sempre lhe pagava menos com a história dos juros. Foi ai que um
soldado amarelo apareceu e o chamou para um jogo de cartas, como o homem era
autoridade, aceitou, mas logo após a primeira rodada foi embora. O soldado lhe
seguiu o perturbando até que Fabiano enraivecido xingou a mãe dele. Com isso
foi para cadeia. A ignorância que a pobreza lhe causara não permitiu que ele se
explicasse e assim ganhou uma surra e uma noite na prisão. Mesmo assim a vida
melhorara, Sinhá Vitória acreditava que para a felicidade ser praticamente completa
bastava uma cama de verdade diferente daquela que possuíam, feita de varas que
os incomodavam durante o sono. Os meninos apenas se divertiam no barreiro junto
com a cachorra Baleia. O mais novo em uma tentativa de imitar o pai tentou
montar um bode o que só lhe deu uma queda e humilhação por parte do irmão e de
Baleia. E o menino mais novo, buscando o significado de inferno, apenas ficou
chateado com a má vontade que lhe explicaram. O inverno chegou e a família se
acalentava frente à fogueira onde travavam pequenas conversas primárias. O
natal também chegou e com isto toda a família vestida de roupas novas que só
lhes incomodavam foi à missa, tanta gente os assustava e com a lembrança nunca
esquecida da injustiça aprontada pelo soldado amarelo, Fabiano bebeu e saiu a
desafiar os homens. Acabou deitado na calçada tirando um cochilo, enquanto
Sinhá Vitória fumava e os filhos brigavam com Baleia por ter desaparecido.
Depois desses tempos Baleia adoeceu. Feridas apareceram, o pelo caiu e ela
emagreceu. Fabiano decidiu matá-la de forma rápida que lhe poupasse o
sofrimento. Sinhá Vitória se trancou com os filhos e tampou-lhes os ouvidos.
Fabiano com um tiro feriu o traseiro da cachorrinha que assustada se arrastou
até os juazeiros onde sem compreender morreu. Certo dia caminhando pela catinga
Fabiano se encontrou com o soldado amarelo que nunca esquecera. Precipitou-se
erguendo o facão, mas parou antes de ferir o homem. Viu como ele era um frouxo
já que nem se aguentava de tanto tremer. Ficaram frente a frente até que o
soldado viu que Fabiano recuara, perguntou-lhe o caminho, Fabiano respondeu
tirando o chapéu. As trapaças do patrão o perturbavam e as contas de Sinhá
Vitória sempre mostravam que eles estavam sendo enganados, mas quando foi
reclamar o patrão se encheu de fúria e disse que ele podia ir embora, Fabiano
perdeu o emprego. Fabiano desculpou-se e foi embora. Nesse contexto a seca
voltava.
O bebedouro secava, o rio também, vinham ainda dezenas de
pássaros que bebiam o pouco de água que restava aos bichos que emagreciam.
Fabiano matava-os, mas eram muitos. Os que ele matava salgavam e guardavam. A
seca chegou. Fabiano sabia que era hora de partir, de fugir, mas adiava. Foi
então que matou o único bezerro que lhes pertenciam e salgaram junto a carne
dos pássaros, trancaram a fazenda e partiram. Sem avisar. Fabiano se
atormentava com as lembranças: o soldado amarelo, a cachorra Baleia, o cavalo
que ficou pra morrer já que pertencia ao patrão e ele não podia levá-lo. Mas
depois começaram a conversar e as léguas passaram sem nem verem, almoçaram e as
esperanças de encontrar uma terra nova onde os filhos teriam futuros diferentes
e eles um presente mais digno onde não precisariam fugir da seca, os levou
embora.
3 - CAPITÃES DA AREIA → JORGE AMADO
PERSONAGENS:
ü Dalva:
prostituta conquistada por Gato;
ü Dora:
a primeira capitã de areia;
ü Gato:
malandro;
ü João
Grande: o bom negro, segundo no comando (apenas atrás de Pedro Bala);
ü Padre
José Pedro: único que se relaciona com os Capitães de Areia;
ü Pedro
Bala: líder do grupo, de cabelos compridos e loiros;
ü Pirulito:
tem grande tendência religiosa;
ü Professor:
lê e desenha vorazmente;
ü Querido-de-Deus:
um capoeirista amigo do grupo;
ü Sem-pernas:
o garoto que serve de espião;
Os Capitães da Areia nos conta sobre um grupo de meninos de
rua. O livro é dividido em três partes. Antes delas, no entanto, via uma
sequência de pseudo-reportagens, explica-se que os “Capitães da Areia” é um
grupo de menores abandonados e marginalizados, que aterrorizam Salvador. Os
únicos que se relacionam com eles são Padre José Pedro e uma mãe-de-santo. O
Reformatório é um antro de crueldades e a polícia caçam-nos como os adultos.
A primeira parte em
si, conta algumas histórias quase independentes sobre alguns dos principais
Capitães da Areia (o grupo chegava a quase cem, morando num trapiche
abandonado, mas tinha líderes). Pedro Bala, o líder, de longos cabelos loiros e
uma cicatriz no rosto. Uma espécie de pai para os garotos, mesmo sendo tão
jovem quanto os outros, e depois descobre ser filho de um líder sindical morto
durante uma greve. Volta Seca, afilhado de Lampião, que tem ódio das
autoridades e o desejo de se tornar cangaceiro; Professor, que lê e desenha
vorazmente, sendo muito talentoso; Gato, que com seu jeito malandro acaba
conquistando uma prostituta, Dalva; Sem-Pernas, o garoto coxo que serve de
espião se fingindo de órfão desamparado (e numa das casas que vai é bem
acolhido, mas trai a família ainda assim, mesmo sem querer fazê-lo de verdade).
João Grande, o "negro bom" como diz Pedro Bala, segundo em comando;
Querido-de-Deus um capoeirista que é só amigo do grupo; e Pirulito, que tem grande
fervor religioso. O ápice da primeira parte vem em duas partes: quando os
meninos se envolvem com um carrossel mambembe que chegou na cidade, e exercem
sua meninice; e quando a varíola ataca a cidade e acaba matando um deles, mesmo
com Padre José Pedro tentando ajudá-los e se encrencando por isso.
A segunda parte,
"Noite da Grande Paz, da Grande Paz dos teus olhos", surge uma
história de amor quando a menina Dora torna-se a primeira "Capitã da
Areia", e mesmo que inicialmente os garotos tentem tomá-la a força, ela se
torna como mãe e irmã para todos. (O homossexualismo é comum no grupo, mesmo
que em dado momento Pedro Bala tente impedi-lo de continuar). Mas Professor e
Pedro bala se apaixonam por ela, e Dora se apaixona por Pedro Bala. Quando
Pedro e ela são capturados (ela em pouco tempo passa a roubar como um dos
meninos), eles são muito castigados, respectivamente no Reformatório e no
Orfanato. Quando escapam, muito enfraquecidos, se amam pela primeira vez na
praia e ela morre, marcando o começo do fim para os principais membros do
grupo.
"Canção da Bahia, Canção da Liberdade", a terceira parte, vai nos mostrando a
desintegração dos líderes. Sem-Pernas se mata antes de ser capturado pela
polícia que odeia.
Professor parte para o RJ para se tornar um pintor de
sucesso, entristecido com a morte de Dora. Gato se torna um malandro de
verdade, abandonando eventualmente sua amante Dalva, e passando por Ilhéus;
Pirulito se torna frade; Padre José Pedro finalmente consegue uma paróquia no
interior, e vai para lá ajudar os desgarrados do rebanho do Sertão; Volta Seca se
torna um cangaceiro do grupo de Lampião e mata mais de 60 soldados antes de ser
capturado e condenado; João Grande torna-se marinheiro; Querido-de-Deus
continua sua vida de capoeirista e malandro; Pedro Bala, cada vez mais
fascinado com as histórias de seu pai sindicalista, vai se envolvendo com os
doqueiros e finalmente os Capitães da Areia ajudam numa greve. Pedro Bala
abandona a liderança do grupo, mas antes os transforma numa espécie de grupo de
choque. Assim Pedro Bala deixa de ser o líder dos Capitães de Areia e se torna
um líder revolucionário comunista.
4 - DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS - JORGE AMADO
Modernismo de segunda fase. A história é dividida em 5
partes (cada uma aberta por uma lição de culinária de Flor, que é professora
desta arte, com exceção da quarta parte, aberta por um programa para o concerto
de Teodoro) e um intervalo.
A primeira parte começa
com a morte de Vadinho em pleno Domingo de Carnaval. Vestido de baiana, Vadinho
cai enquanto dançava e seu funeral é muito concorrido. Nele voltam as
lembranças de todos sobre o falecido: os amigos de farra, as possíveis
(prováveis) amantes, os conhecidos e principalmente da esposa, Flor. Flor
lembra do marido infiel, cheio de lábia, espertalhão, jogador e malicioso que
era Vadinho, mas ainda assim extremamente adorável. Na definição de um dos
presentes no funeral, Vadinho "Era um porreta".
O anteriormente referido intervalo se trata da discussão que
ocorreu na cidade sobre a autoria da elegia a Vadinho, poesia anônima picante.
A segunda parte passa-se
durante o período de luto de Flor. Inconsolável com a morte de Vadinho, sua mãe
volta para a cidade e a situação piora. Dona Rosilda é o mais perfeito modelo
de sogra: odeia o genro, é chata, controladora, exibida e pretende sempre
escalar na vida social. Passa a fazer intriga sobre o falecido ("era morte
para festa") com várias beatas, enquanto algumas poucas defendem Vadinho
(não seus atos) por ele ser uma pessoa excepcional (no sentido de incomum, não
o de maravilhoso ou com deficiência mental). Assim em flashback é mais detalhado
o passado do casal. A mãe de Flor queria que as filhas se casassem com homens
ricos, e Vadinho apareceu. Eles se conheceram numa festa chique (Vadinho entrou
de penetra, com a ajuda do tio) e começaram o namoro com a benção de Dona
Rosilda, até que ela descobriu quem era o genro. Mais tarde Flor sai de casa e
se casa (de azul, porque não teve coragem de por o branco) e começa o
casamento. Vadinho é um marido ausente, sempre gastando o dinheiro (dos outros)
no jogo e nas mulheres. Certa vez Flor quase adotou um menino que ela achava
ser filho de Vadinho (Flor é estéril; o filho era do "xará"). E assim
são mostrados os vários acontecimentos, em flashback, da vida matrimonial com
aquele adorável cafajeste, generoso gastador, infiel e amantíssimo marido que
era Vadinho. O capítulo acaba com Flor pondo flores sobre o túmulo do falecido,
superando melhor o passamento dele.
A terceira parte é
passada nos meses seguintes. Flor está mais alegre, apesar de manter ainda a
fachada de viúva. Todas as beatas competem para achar-lhe um bom pretendente e
quem aparece é Eduardo, o Príncipe, calhorda que enganava viúvas para
roubar-lhes as economias. Descoberto, Flor passa a se retrair. Seu sono
torna-se mais agitado, seu desejo cresce na medida em que ela deixa os homens
fora de sua vida pessoal. Mas então o farmacêutico Teodoro Madureira,
respeitado solteirão (ele ficara solteiro para cuidar da mãe paralítica, que
morreu pouco antes), ele propõe casamento a Dona Flor e eles tem o mais casto
dos noivados, nunca ficando juntos sozinhos. O capítulo acaba com o casamento
de Flor, desta vez aprovado por sua mãe (que havia saído da cidade no começo do
capítulo; nem as outras beatas aguentavam Dona Rozilda).
A quarta parte começa
com a lua-de-mel de Dona Flor. Teodoro é diferente do falecido em tudo. Fiel
(não compreende mesmo quando uma cliente da farmácia levanta o vestido BEM alto
para tentá-lo), regular (sexo às quartas e sábados, bis aos sábados e
facultativo às quartas) e inteligente, Teodoro trás a paz de volta à vida de
Dona Flor. Teodoro toca fagote numa orquestra de amadores e o maestro compõem
uma linda música para ela que Teodoro toca solo (o convite abre o capítulo) e
no dia do aniversário de casamento, após os convidados partirem Flor vê
Vadinho, nu como o viu na cama no dia de sua morte, a puxá-la e tentá-la. Ela
se recusa naquele momento, fiel ao marido. Teodoro vai dormir e Vadinho sai
logo depois, quando Flor ia procurá-lo. Começa aqui a parte do livro que o
deixou famoso: Flor, Teodoro e Vadinho, vivendo em matrimônio ao mesmo tempo,
Vadinho nu, invisível a todos menos Flor.
A quinta parte,
que tornou famoso livro, filme, seriado e tantas quanto foram as adaptações
desta obra, começa com o Vadinho vindo de volta dos mortos, tentando Flor. Flor
sente-se dividida entre o esposo atual e Vadinho, mas este diz-lhe que não há
por que o estar: são colegas, casados frente ao juiz e ao padre. Flor vai aos
poucos perdendo a resistência e chega a encomendar um trabalho para mandar
Vadinho de volta para onde estava. Enquanto isso se passa Vadinho vai
manipulando as mesas de jogo, favorecendo velhos amigos, levando Pellanchi
Moulas, rei do jogo em Salvador, ao desespero e a todos os "místicos"
da Bahia para se livrar do azar. Vadinho só para quando seus amigos cansam
(Mirandão, companheiro seu quando era vivo, para de jogar definitivamente,
assustado com o repetir de vezes que caía nº 17, número de sorte de Vadinho).
Por fim Dona Flor sucumbe a Vadinho e passam a viver harmoniosamente os três
uma vida conjugal (mesmo que Teodoro não o saiba). Vadinho chega a fazer o
milagre de expulsar a sogra quando ela chega de mala e cuia para ficar. Vadinho
começa então a desaparecer e Flor se dá conta de que era por causa do feitiço
por ela encomendado. Há uma batalha entre vários deuses contra Exu
(identificado por alguns como sendo o diabo católico), que protege Vadinho.
Quando Exu estava perdendo, o amor e a volúpia de Vadinho ganham a batalha.
A obra acaba com Flor andando feliz com Teodoro e Vadinho
(nu, como sempre) ao seu lado, pelas ruas de Salvador.
Esta parte acentua duas características gerais da obra: a
religiosidade que mistura ao mesmo tempo o catolicismo e o candomblé, pondo
todas as figuras míticas das duas religiões junto e eficientemente simultâneas
(algo como é a religiosidade baiana, já que Salvador tem mais igrejas que
qualquer outra cidade do Brasil e ainda assim é centro das religiões de origem
africana). A outra característica vem a ser o fato de que Vadinho e Teodoro são
metáforas para o id e o superego, respectivamente. Vadinho é rebelde,
impulsivo, espontâneo e dado ao caos (no seu caso, o jogo); Teodoro é metódico
e controlado ("Um lugar para cada coisa e cada coisa em seu lugar" é
seu lema, pendurado na farmácia). Assim, a imagem de Flor pacificamente com os
dois, totalmente feliz, invoca o ideal de equilíbrio entre os dois.
5 - GABRIELA CRAVO E CANELA - JORGE AMADO
Modernismo de segunda fase Gabriela Cravo e Canela é
dividido em duas partes, que são em si divididas em outras duas. A história
começa em 1925, na cidade de Ilhéus.
A primeira parte é
Um Brasileiro das Arábias e sua primeira divisão é O langor de Ofenísia. Vai
centrando-se a história nesta parte em dois personagens: Mundinho Falcão e
Nacib. Mundinho é um jovem carioca que emigrou para Ilhéus e lá enriqueceu como
exportador e planeja acelerar o desenvolvimento da cidade, melhorar os portos e
derrubar Bastos, o inepto governante. Nacib é um sírio ("turco é a
mãe!") dono do bar Vesúvio, que se vê em meio a uma grande tragédia
pessoal: a cozinheira de seu partiu para ir morar com o filho e ele precisa
entregar um jantar para 30 pessoas em comemoração a inauguração de uma linha
automotiva regular para a cidade de Itabuna. Ele encomenda com um par de gêmeas
careiras, mas passa toda a parte procurando por uma nova cozinheira.
No final desta pequena parte aparece Gabriela, uma retirante
que planeja estabelecer-se em Ilhéus como cozinheira ou doméstica, apesar dos
pedidos do amante que planeja ganhar dinheiro plantando cacau.
A segunda secção
desta primeira parte é A solidão de Glória e passa-se apenas em um dia. O dia
começa com o amanhecer de dois corpos na praia, frutos de um crime passional (todo
mundo dá razão ao marido traído / assassino), segue com as preparações do
jantar e a contratação de Gabriela por Nacib. No jantar acirram-se as
diferenças políticas e, na prática, declara-se a guerra pelo poder em Ilhéus
entre Mundinho Falcão (oposição) e os Bastos (governo). Quando o jantar acaba
(em paz), Nacib volta para casa e, quando ia deixar um presente para Gabriela
silenciosa mas não inocentemente, tem com ela a primeira noite de amor /
luxúria.
A segunda parte chama-se propriamente Gabriela Cravo
e Canela e sua primeira parte, o capítulo terceiro, chama-se O segredo de
Malvina.
O terceiro
capítulo, passa-se cerca de três meses após o fim do outro capítulo, e três
problemas existem: o caso Malvina-Josué-Glória-Rômulo, as complicações políticas
e o ciúmes de Nacib. Vamos pela ordem. Josué era admirador de Malvina, filha de
um coronel com espírito livre. Esta começa a namorar Rômulo, um engenheiro
chamado por Mundinho Falcão para estudar o caso da barra (que impedia que
navios grandes atracassem no porto de Ilhéus). Josué se desaponta e se
interessa por Glória, amante de um outro coronel. Rômulo foge após um escândalo
feito pelo machista (tão machista quanto o resto da sociedade ilheense) pai de
Malvina, Malvina faz planos de se libertar e Josué começa um caso em segredo
com Glória. Na política, acirra-se a disputa por votos ao ponto do coronel
Bastos mandar queimar toda uma tiragem do jornal de Mundinho. Mas Mundinho
ganha terreno com a chegada do engenheiro. E perde quando esse foge covarde. E ganha
com a promessa da chegada de dragas a Ilhéus. Nacib enquanto isso desenvolveu
um caso com Gabriela. Mas está sendo atacado pelos ciúmes (todos querem
Gabriela, perfume de cravo, cor de canela). Aos poucos ele percebe que é amor e
acaba propondo casamento a Gabriela após a última investida do juiz (alarme
falso, ele já havia desistido). Mas foi a tempo, já que até roças do poderoso
cacau de Ilhéus já haviam sido oferecidas a Gabriela. O capítulo acaba durante
a festa de casamento de Nacib e Gabriela (no civil, já que Nacib é muçulmano
não-praticante), quando chegam as dragas no porto de Ilhéus.
A quarta e
última parte chama-se O
luar de Gabriela. Nesta resolvem-se todos os casos. Pela ordem: Josué e Glória
oficializam a relação e Glória é expulsa de sua casa por seu coronel. Na parte
da política, após o coronel Ramiro Bastos perder o apoio de Itabuna (e mandar
matar, sem sucesso, seu ex-aliado; o quase assassino foge com a ajuda de
Gabriela, que o conhecia), ele morre placidamente em seu sono, seus aliados
reconhecem que estavam errados (a lealdade era com o homem, não suas idéias) e
a guerra política acaba com Mundinho e seus candidatos vencedores. Quanto a
Nacib e Gabriela... Gabriela não se adapta de jeito nenhum à vida de
"senhora Saad", para desespero de Nacib. Nacib acaba anulando o
casamento ao pegá-la na cama com Tonico Bastos, seu padrinho de casamento. Mas
ninguém ri de Nacib; pelo contrário, Tonico é humilhado e sai da cidade, o
casamento é anulado sem complicações (os papéis de Gabriela eram falsos) e
Gabriela sai de casa. Nacib fica amargurado e vai se recuperando. As obras na
barra se completam com sucesso e Nacib e Mundinho abrem um restaurante juntos.
O cozinheiro chamado pelos dois é... convidado a se retirar da cidade por
admiradores de Gabriela, que acaba sendo recontratada por Nacib. Semanas
depois, Nacib e ela reiniciam seu caso, tão ardente como era no começo e
deixara e ser após o casamento.
Num epílogo, o coronel, assassino dos dois amante da
primeira parte, é condenado à prisão. Cheio de uma crítica à sociedade
ilheense, a própria linguagem do autor muda quando foca-se a atenção em
Gabriela. Torna-se mais cantada, mais típica da região (como é a fala de
todos), deixando a leitura cada vez mais saborosa.
6 - FOGO MORTO → JOSÉ LINS DO REGO
PERSONAGENS PRIMÁRIOS:
ü José
Amaro: um dos protagonistas da obra, tem fama de lobisomem;
ü Sinhá:
mulher de José Amaro;Marta: filha de José Amaro;
ü Capitão
Antônio Silvino: cangaceiro que Marta apoiava;
ü Floripes:
o negro;
ü Luís
Cezar de Holanda: genro de Tomás Cabral de Melo;
PERSONAGENS SECUNDÁRIOS:
ü Amélia
- esposa de Coronel Lula
ü Adriana
- esposa de Capitão Vitorino
ü Neném
- filha de Coronel Lula
ü
Luís - filho do Capitão Vitorino (o único em ascensão social)
ü Tenente
Maurício: opressor, comanda uma tropa de facínoras.
ü Negro
Passarinho: cantor ingênuo, escravo recém-liberto, corroído pelo vício da bebida.
ü Coronel
José Paulino: senhor de engenho que se alia a todos os governos.
ü Cego
Torquato: agente de ligação com Antônio Silvino
ü Cabra
Alípio: devotado de corpo e alma ao cangaço
A narrativa faz parte do ciclo-de-açúcar e é dividida em
três partes, cada uma delas apresentando o que acontece em torno de seus
personagens principais: Mestre José Amaro, o engenho de Seu Lula e o Capitão
Vitorino Carneiro da Cunha.
A primeira parte enfoca
principalmente a figura de um velho seleiro frustrado - Mestre José Amaro.
Chegou ao Engenho Santa Fé trazido pelo pai, o velho Amaro; "homem valente
que viera de Goiana, com uma morte nas costas". Devido às andanças pela
noite, Mestre José Amaro ganha fama de lobisomem. Sustentavam que saía em busca
de sangue. Culpa toda a sua infelicidade na esposa, Sinhá, e na loucura da
filha Marta. Apoiava o cangaceiro Capitão Antônio Silvino, o único que levava
justiça aos pobres e colocava medo nos grandes. Devido a uma intriga com o
negro Floripes, recebe intimação de deixar a sua casa no Engenho Santa Fé. As
brigas com o senhor de engenho somam-se às desilusões com a própria profissão e
com a vida familiar. A mulher o abandona, a filha é levada para a Tamarineira.
Não suportando as frustrações e a solidão, Mestre José Amaro acaba por
suicidar-se.
O engenho de seu Lula é o título da segunda parte e retrata a história
do Engenho Santa Fé, erguido pelo capitão Tomás Cabral de Melo. O engenho
prosperava no pulso firme de trabalho do capitão. O seu genro Luís César de
Holanda Chacon, não gostava de trabalhar para a prosperidade do engenho e só
tinha ares aristocráticos e uma compulsão por rezas. O Santa Fé entre em rápido
declínio. Seu Lula maltratava os negros e após a abolição todos se retiraram
exceto o negro Macário.
A terceira parte tem
por título o Capitão Vitorino, compadre de Mestre Amaro e que até a segunda
parte do romance era visto apenas como motivo de zombaria. Falava mal de tudo e
de todos que não gostava, inclusive dos senhores de engenho. O mestre Amaro
considerava-o vagabundo e falador. Contudo, na terceira parte Vitorino é
apresentado como verdadeiro herói quixotesco, que vivia lutando e brigando por
justiça e igualdade, sempre em defesa dos humildes contra os poderosos da
terra. Não media consequência em desafiar as autoridades e até mesmo ao
cangaceiro Antônio Silvino. Falava o que pensava e sonhava com dia em que
governasse.
É notável a habilidade de José Lins do Rego em encadear as
três partes narradas, que se direcionam para mostrar a decadência do engenho e
o que acontece com seus habitantes.
7 - MENINO DE ENGENHO → JOSÉ LINS DO REGO
Em Menino de Engenho, temos a situação socioeconômica do
engenho de açúcar que marcará a parte mais significativa das produções de José
Lins do Rego. As tensões sociais apontadas pelo menino narrador-protagonista da
história serão dinamizadas nos romances posteriores, em especial em Fogo Morto.
Outros temas de sua obra são aqui indicados: o misticismo e a religiosidade
populares, o cangaceirismo; a atmosfera é de tristeza e de decadência.
Publicado em 1932, Menino do Engenho é a estreia em romance
de José Lins do Rego e já traz os valores que o consagraram na Literatura
Brasileira. O primeiro aspecto é a sua filiação à Prosa Regionalista
Modernista.
Durante a década de 30 do século XX, virou moda uma produção
que se preocupava em apresentar a realidade nordestina e os seus problemas,
numa linguagem nova, introduzida pelos participantes da Semana de Arte Moderna
de 22. José Lins do Rego seria o melhor representante dessa vertente, se certas
qualidades suas não atenuassem fortemente o tom crítico esperado na época.
A intenção do livro afastou a visão político-social do
romance. Nascido com a intenção de ser memórias (o primeiro título de fato ia
ser Memórias de um Menino de Engenho), o autor está mais preocupado em reunir
flashes do passado do que em produzir uma análise aprofundada de sua realidade
(essa técnica faz lembrar o estilo impressionista de O Ateneu, de Raul Pompéia,
romance que o próprio José do Lins do Rego cita em Menino de Engenho. No
entanto, as comparações só se tornarão mais nítidas na sequência dessa obra,
Doidinho). Dessa forma, tudo será carregado de um saudosismo que tornará a obra
melosa, sentimental, próxima da idealização da realidade, muitas vezes até
ingenuidade. É o que impossibilitará o fôlego para uma crítica social mais
efetiva.
Há quem enxergue nessa inocência um ponto positivo para
tornar a obra uma das mais brasileiras de nossa literatura. Existe a ideia,
real ou atribuída, de que nosso povo tem um olhar afetivo sobre tudo, o que o
torna submisso, passivo, avesso a protestos e revoluções. Ideia questionável, mas
interessante.
É o que de fato enxergamos na atitude do seu
narrador-protagonista. Talvez seu histórico explique tais atitudes. Quando
tinha quatro anos, seu pai, de forma passional, acaba assassinando sua esposa,
o que o faz ser preso e depois ser colocado num hospício. Por causa disso,
passa a ser criado pelo avô, José Paulino, senhor de engenho.
Recebe todos os mimos, pois é criança da cidade e vítima de
tão gigantesco infortúnio. Pouco depois, desenvolve “puxado” (asma), o que o
torna mais vulnerável ainda. Somando-se à saudade da mãe e do pai, e à maneira
largada com que é criado (só tem atenção mesmo da tia, que pouco depois se
casa), acaba tornando-se uma criança melancólica, que passa horas ensimesmada
enquanto caça passarinhos em plena solidão.
Em suma, tudo isso contribui para que José Lins do Rego
toque na realidade de maneira bastante emotiva, o que camufla problemas graves.
Percebemos isso principalmente na idealização que faz do seu avô, José Paulino,
um senhor do engenho, dono do Santa Rosa (há quem entenda que um dos problemas
está na narração em primeira pessoa, muito utilizada pelo autor, o que torna
sua visão limitada, graças à subjetividade. Talvez isso explique por que seus
melhores romances são Usina e Fogo Morto, em que se usa a terceira pessoa,
garantidora de objetividade, ou seja, espírito crítico aguçado). Na sua visão
infantil, não percebe que, como riquíssimo proprietário, é um concentrador de
terra e de renda, chegando a achar natural a pobreza dos trabalhadores, não
estabelecendo ligação entre os dois fatos.
A inocência (a inocência pode ser justificada pela
fidelidade que o narrador manteve em relação ao pensamento infantil. Há
momentos em que ele chega a reconhecer as falhas desse tipo de pensamento,
demonstrando que, adulto, passou a desenvolver mais criticidade. Mas não é um
argumento que possa ser aplicado a todo momento na obra) do protagonista é
tamanha que doura a doença e a subnutrição das famílias dos peões,
considerando-os superiores, por mais resistentes, a ele próprio.
Pode-se até perdoar o relato da cheia destruidora e
assassina como um motivo de festa. Criança agita-se mesmo com tais mudanças de
rotina. Ou até as descomposturas que o senhor de engenho passava em seus
empregados, mesmo o serviço estando adiantado. Ou mesmo a submissão muda a que
estes se submetiam diante do patrão. Mas choca a apresentação de José Paulino
como alguém que se intromete nas atribuições do Estado. Tudo bem que resolva
medicar seus escravos (cuida da amputação do dedo de um deles) com a mesma
medicina tosca com que tratava seus familiares. Mas quando o avô parte para
fazer justiça pelas próprias mãos, de forma até violenta, ou influencia o
Judiciário quando há julgamentos que envolvam algum seu protegido, a
característica de seu poder muda de figura. E o pior é que o narrador, Carlos,
ainda diz que seu avô era um santo que plantava cana.
Tudo isso contribui para que José Lins do Rego crie toda uma
crença de que o poder gerado pelos senhores de engenho tornava o mundo melhor,
talvez uma filosofia, como amplamente demonstrada aqui, baseada numa
idealização do passado. O problema é o autor viveu numa época de transição da
substituição do sistema do engenho (método de produção de açúcar de cana de
forma artesanal) para a usina (produção industrial). Dessa forma, seu
saudosismo é um canto para uma sociedade que não existe mais.
Como se disse, se essa emotividade compromete o olhar
analítico do autor, que era exigido em sua época, mantém uma presumida
fidelidade ao jeito de ser brasileiro. Essa criança, largada no engenho, passa
sua infância entre brincadeiras com os primos, os filhos dos empregados, ouve
as conversas das negras na cozinha, além das histórias fantásticas e
folclóricas da Velha Totonha ou as que narravam os feitos políticos, estas na
boca do avô. Nosso país está aqui.
Em meio aos relatos do cotidiano do engenho, suas festas e
sua labuta, há espaço para a sexualização precoce do protagonista, que se dá
primeiro observando as coberturas dos bovinos e equinos e depois presenciando
(e quem sabe participando de) bestialidades.
Nesse contexto, fica até interessante a separação que
tentará estabelecer entre seu histórico lascivo, aumentado pelas masturbações
provocadas pela Negra Luísa, e a paixão que vai desenvolver por uma prima
civilizada, de Recife, Maria Clara. Tenta manter a menina longe da imagem
sexual, mas sempre explodem em sonhos desejos de forte, apesar de reprimida,
conotação carnal.
Dessa forma, o inevitável ocorre. Agarra-se em chamegos a
Zefa Cajá, mulher que era caso de quase todo mundo na região. Apesar das
resistências dela, que alegava o menino ainda cheirar a leite, acaba se
deixando seduzir (provavelmente se faz de ser comprada, graças ao tanto que ele
furtava da casa grande para ela) e inicia-o sexualmente. A consequência, mais
ou menos esperada, é pegar doença venérea.
Torna-se então o símbolo do menino perdido, apesar de bem
visto por algumas pessoas, por simbolizar um prodígio de masculinidade. Isso
tudo apressa sua ida ao colégio interno, o que acelera o final da narrativa,
abrindo caminho para a próxima obra, Doidinho.
8 - O QUINZE → RACHEL DE QUEIRÓS
→ PRIMEIRO PLANO - VICENTE E CONCEIÇÃO
O primeiro e mais popular romance de Rachel de Queiroz é O
Quinze. O título se refere a grande seca de 1915, vivida pela escritora em sua
infância. O romance se dá em dois planos, um enfocando o vaqueiro Chico Bento e
sua família, o outro a relação afetiva de Vicente, rude proprietário e criador
de gado, e Conceição, sua prima culta e professora.
O enredo é interessante, dramático, mostrando a realidade do
Nordeste brasileiro. No interior do Ceará, na fazenda Logradouro, perto de
Quixadá, Conceição fora passar suas férias com a avó, que chamava de mãe Nácia.
Conceição não chegou em um momento muito feliz, pois a seca estava forte,
matando a vegetação e os animais. Vicente, seu primo, que morava com seus pais
e suas irmãs em outra fazenda, fazia esforços sobre-humanos para que o gado
conseguisse passar pela seca sem que fosse preciso soltá-lo para que morresse
longe, como muitos fazendeiros faziam, devido ao desespero. Eles se amavam, mas
Conceição estava em dúvida, pois estava acostumada na cidade, havia estudado e
Vicente não passava de um fazendeiro semianalfabeto.
Conceição é apresentada como uma moça que gosta de ler
vários livros, inclusive de tendências feministas e socialistas o que estranha
a sua avó, Mãe Nácia - representante das velhas tradições. No período de
férias, Conceição passava na fazenda da família, no Logradouro, perto do
Quixadá. Apesar de ter 22 anos, não dizia pensar em casar, mas sempre se
"engraçava" à seu primo Vicente. Ele era o proprietário que cuidava
do gado, era rude e até mesmo selvagem.
Com o advento da seca, a família de Mãe Nácia decide ir para
cidade e deixar Vicente cuidando de tudo, resistindo. Trabalhava
incessantemente para manter os animais vivos. Conceição, trabalhava agora no
campo de concentração onde ficavam alojados os retirantes, e descobre que seu
primo estava "de caso" com "uma caboclinha qualquer".
Enquanto ela se revolta, Mãe Nácia à consola dizendo: "Minha filha, a vida
é assim mesmo... Desde hoje que o mundo é mundo... Eu até acho os homens de
hoje melhores."
Vicente se encontra com Conceição e sem perceber confessa as
temerosidades dela. Ela começa a trata-lo de modo indiferente. Vicente se
ressente disso e não consegue entender a razão.
As irmã de Vicente armam um namoro entre ele e uma amiga, a
Mariinha Garcia. Ele porém se espanta ao "saber" que estava
namorando, dizendo que apenas era solícito para com ela e não tinha a menor
intenção de comprometimento.
Conceição percebe a diferença de vida entre ela e seu primo
e a quase impossibilidade de comunicação. A seca termina e eles voltam para o
Logradouro.
→ SEGUNDO PLANO - CHICO BENTO E SUA FAMÍLIA
Sem dúvida a parte mais importante do livro. Apresenta a
marcha trágica e penosa do vaqueiro Chico Bento com sua mulher e seus 5 filhos,
representando os retirantes. Ele é forçado a abandonar a fazenda onde
trabalhara. Junta algum dinheiro, compra mantimentos e uma burra para
atravessar o sertão. Tinham o intuito de trabalhar no Norte, extraindo
borracha.
No percurso, em momento de grande fome, Josias, o filho mais
novo, come mandioca crua, envenenando-se. Agonizou até a morte. O seu fim está
bem descrito nessa passagem: "Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova à
beira da estrada, com uma cruz de dois paus amarrados, feita pelo pai.
Ficou em paz. Não tinha mais que chorar de fome, estrada
afora. Não tinha mais alguns anos de miséria à frente da vida, para cair depois
no mesmo buraco, à sombra das mesma cruz."
No Campo de Concentração, Conceição reconhecia muitas
famílias, que moravam perto da fazenda de sua avó; um dia reconheceu seu
compadre Chico Bento e sua família, que depois do desespero passado conseguira
chegar à cidade; um dos filhos morreu envenenado, o outro desapareceu, sua mulher
e o filho mais novo em estado lastimável. Conceição com muita pena, depois de
ajudá-los, ficou com seu afilhado, que estava muito doente; tratou-o com
carinho e conseguiu que ele se salvasse. Depois de muito desespero, muita fome,
crimes cometidos, muito horror, choveu no Ceará.
Uma cena marcante na vida do vaqueiro foi a de matar uma
cabra e depois descobrir que tinha dono. Este o chamou de ladrão, e levou o
resto da cabra para sua casa, dando-lhes apenas as tripas para saciarem. Léguas
após, Chico Bento dá falta do seu filho mais velho Pedro. Chegando ao Aracape,
lugar onde supunha que ele pudesse ser encontrado, avista um compadre que era o
delegado. Recebem alguns mantimentos mas não é possível encontrar o filho.
Ficam sabendo que o menino tinha fugido com comboeiros de cachaça. Notem:
"Talvez fosse até para a felicidade do menino. Onde
poderia estar em maior desgraça do que ficando com o pai?"
Ao chegarem no campo de concentração, são reconhecidos por
Conceição, sua comadre. Ela arranja um emprego para Chico Bento e passa a viver
com um de seus filhos. Conseguem também uma passagem de trem e viajam para São
Paulo, desistindo de trabalhar com a borracha.
O mais famoso livro de Rachel de Queiroz é mediano com
alguns bons momentos.
9 - A BAGACEIRA - JOSÉ AMÉRICO DE ALMEIDA
O marco inicial da segunda fase do Modernismo brasileiro é
considerado o lançamento do romance A Bagaceira, de José Américo de Almeida, em
1928. Inaugura o ciclo do “romance nordestino” dos anos 30.
O enredo baseia-se no êxodo da seca de 1898, descrito como
"(...) Uma ressurreição de cemitérios antigos - esqueletos redivivos, com
o aspecto e o fedor das covas podres.(...)".
Obra-prima do romance regionalista moderno, hoje com trinta
e duas edições em língua portuguesa, edição crítica e versões em espanhol,
francês, inglês e esperanto. Sua obra, com dezessete títulos, abriga ainda
ensaios, oratória, crônica, memórias e poesia.
A história se passa entre 1898 e 1915, os dois períodos de
seca.
Tangidos pelo sol implacável, Valentim Pereira, sua filha
Soledade e o afilhado Pirunga abandonam a fazenda do Bondó, na zona do sertão.
Encaminham-se para as regiões dos engenhos, no rejo, onde encontram acolhida no
engenho Marzagão, de propriedade de Dagoberto Marçau, cuja mulher falecera por
ocasião do nascimento do único filho, Lúcio.
Passando as férias no engenho, Lúcio conhece Soledade, e por
ela se apaixona. O estudante retorna à academia e quando de novo volta, em
férias, à companhia do pai, toma conhecimento de que Valentim Pereira se
encontra preso por ter assassinado o feitor Manuel Broca, suposto sedutor e
amante de Soledade. Lúcio, já advogado, resolve defender Valentim e informa o
pai do seu propósito: casar-se com Soledade. Dagoberto não aceita a decisão do
filho. Tudo é esclarecido: Soledade é prima de Lúcio, e Dagoberto foi quem
realmente a seduziu. Pirunga, tomando conhecimento dos fatos, comunica ao
padrinho (Valentim) e este lhe pede, sob juramento, velar pelo senhor do
engenho (Dagoberto), até que ele possa executar o seu "dever": matar
o verdadeiro sedutor de sua filha. Em seguida, Soledade e Dagoberto,
acompanhados por Pirunga, deixam o engenho e se dirigem para a fazenda do Bondó.
Cavalgando pelos tabuleiros da fazenda, Pirunga provoca a morte do senhor do
engenho Marzagão, herdado por Lúcio, com a morte do pai.
Em 1915, por outro período de seca, Soledade, já com a
beleza destruída pelo tempo, vai ao encontro de Lúcio, para lhe entregar o
filho, fruto do seu amor com Dagoberto.
PERSONAGENS:
ü Dagoberto Marçau - Proprietário do
engenho Marzagão, simboliza a prepotência, contrapondo-se à fraqueza dos
trabalhadores da bagaceira. Considera-se "dono " da justiça e seu
código é simples: "O que está na terra é da terra". Se ele é o senhor
da terra, tudo que nela dá é da terra (ou seja, dele próprio). "Se ele é o
senhor da terra, tudo que nela se encontra lhe pertence, até os próprios homens
que trabalham no engenho. Assim pensa e assim age. Seduz Soledade, vendo na
sertaneja semelhança com sua ex-mulher.
ü Lúcio - Humano, idealista,
sonhador, apaixona-se por Soledade, com quem mantém um romance puro. Não
compartilha as idéias de seu pai, Dagoberto Marçau, para quem "hoje em dia
não se guarda mais na cabeça: só se deve guardar nas algibeiras.
"Acreditava que se podia desmontar a estrutura anacrônica do engenho:
"Quanta energia mal empregada na desorientação dos processos agrícolas! A
falta de método acarretava uma precariedade responsável pelos apertos da
população misérrima. A gleba inesgotável era aviltada por essa prostração
econômica. A mediania do senhor rural e a ralé faminta".
ü Soledade - Filha de Valentim
Pereira, representa a beleza agreste do sertão. Aos olhos de Lúcio, a
sertaneja. "não correspondia pela harmonia dos caracteres às exigências do
seu sentimento do tipo humano. Mas, não sabia por que, achava-lhe um sainete
novo na feminilidade indefinível. As linhas físicas não seriam tão puras. Mas o
todo picante tinha o sabor esquisito que se requintava em certa desproporção
dos contornos e, notadamente, no centro petulante dos olhos originais."...
"Era o tipo modelar de uma raça selecionada, sem mescla, na mais sadia
consanguinidade."A presença da sertaneja no engenho colocará uma barreira
ainda maior entre Dagoberto e Lúcio. Por Soledade Valentim se torna assassino e
Pirunga causa a morte do senhor de engenho.
ü Valentim Pereira - Representa o
sertão: destemido, arrojado e altivo. Como bom sertanejo pune pela honra de uma
mulher, mata o feitor Manuel Broca, apontado como sedutor de sua filha. Mas a
"ideia fixa da honra sertaneja" vai além: a cicatriz que lhe marcava
o rosto era resultado de uma briga mortal com um amigo, que desonrara uma moça,
neta de um "velhinho", de quem o tempo quebrara as forças. O diálogo
entre Valentim e Brandão de Batalaia (assim se chamava o "velhinho")
é bem ilustrativo: "Que é que vossamecê manda? Ele respondeu que só queria
era morrer. Eu ajuntei: E por que não quer matar?...”
ü Pirunga - Filho de criação de Valentim
Pereira, a quem tributa lealdade. Ama Soledade, mas seu amor não encontra
receptividade. Assim como Valentim, simboliza o sertão: valente, intrépido,
altivo... Por ocasião da festa no rancho , vai em defesa de Latomia:
enfrentando a polícia."O sertanejo fazia frente a toda tropa na confusão
do conflito corpo a corpo. Seu olhar fuzilava na treva como um sabre
desembainhado."
O relato abre o ciclo do romance de 1930, entre outras
razões por sua força de denúncia dos horrores gerados pela seca.
É digno de nota o prefácio que vale tanto ou mais do que
próprio texto narrativo. Destaque para o espanto do escritor face às mazelas:
"Há uma miséria maior do que morrer de fome no deserto: é não ter o que
comer na terra de Canaã."
Na narrativa há um choque de três visões que correspondem a três
processos socioculturais distintos:
1) Visão rústica dos
sertanejos, com seu sentido ético arcaico.
2) Visão brutal e
autoritária do senhor de engenho, representando a velha oligarquia.
3) Visão civilizada
(moderna, urbana) de Lúcio, traduzindo um novo comportamento de fundo
burguês e que logo seria autorizado pela Revolução de 30.
Significativo é o projeto modernizador do personagem Lúcio
ao assumir o comando do engenho: alfabetização dos filhos dos trabalhadores,
melhores condições de habitação, etc. Ou seja, aquilo que Getúlio Vargas
proporia nos anos seguintes como alternativa para o país.
O livro apresenta uma mistura (mal resolvida) de linguagem
tradicional - dominada por um tom desagradavelmente sentencioso - com um gosto
modernista por elipses e imagens soltas, e ainda pelo uso de algumas expressões
coloquiais ou regionais.
10 - INCIDENTE EM ANTARES → ÉRICO VERÍSSIMO
O último romance do escritor Érico Veríssimo, foi publicado
no ano de 1971. A obra, enquadrada no estilo modernista, é de cunho político e
está dividida em duas partes em que os acontecimentos reais se misturam à
ficção.
Na primeira parte da obra, o autor nos apresenta a
fictícia cidade de Antares e as relações políticas entre as facções dos Campo
Largo e dos Vacariano até o dia do famoso incidente.
A cidade de Antares é um pequeno município do Rio Grande do
Sul que em sua concepção, em 1853, fora comandada por Chico Vacariano até que
um oponente, Anacleto Campo Largo, aparece para disputar o domínio do feudo,
dando origem à rivalidade entre as duas famílias por cerca de sete décadas.
Com o passar do tempo e com o advento da modernidade, na
década de 30, a cidade recebe a vista de Getúlio Vargas que consegue aplacar a
rivalidade entre as duas famílias e consegue formar uma aliança entre eles.
Com o tempo, a cidade vai seguindo os acontecimentos
políticos: a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, inaugurando o Estado Novo; a
queda dele; o governo de Dutra; o retorno triunfante de Getúlio em 1951; o
atentado a Lacerda, combatente feroz de Getúlio; o suicídio de Getúlio; a
eleição de JK; a construção de Brasília; o governo de Jânio Quadros que fora
obrigado por forças terríveis a desistir do cargo, entre outros acontecimentos
da história brasileira até que, em 1963, ocorre o incidente mencionado no
título do livro.
Morrem na cidade, inesperadamente, sete pessoas entre eles a
matriarca da família dos Campolargo, mas os coveiros, estando em greve, se
recusam a enterrar os mortos que adquirem “vida” e passam a vasculhar a vida de
seus familiares e a apontar os defeitos e a podridão moral da sociedade.
Os defuntos exigem que as autoridades os enterrem em um
prazo máximo de 24 horas ou prometem ficar a apodrecer no coreto da cidade.
Enquanto esperavam por uma resolução do governo, decidem visitar seus amigos e
parentes.
Na segunda parte - Ao meio dia, os mortos e os
vivos se encontram na praça da cidade para discutir o problema da greve e os
mortos revelam os segredos sujos de todos da cidade. Após um tremendo rebuliço,
a greve termina, os mortos são finalmente enterrados e a cidade decide negar e
desmentir o incidente a todos os jornalistas que procuram desvendar o que
acontecera em Antares.
Por fim, a cidade segue seu curso e as “máscaras” são
gradativamente recolocadas.
11 - O TEMPO E O VENTO → ÉRICO VERÍSSIMO
Trata-se de um conjunto de sete livros, que conta à história
da formação do povo Rio Grande do Sul, Érico Veríssimo de uma maneira original
e fascinante mistura ficção com fatos da realidade político e social do Brasil:
como a guerra dos Farrapos, a era Vargas, entre outros.
A obra divide-se em:
ü O
Continente;
ü O
Retrato;
ü O
Arquipélago.
O CONTINENTE -
A história remonta ao século XVII, época da evangelização dos jesuítas, e o
encontro de um índio, Pedro Missioneiro, criado pelos padres jesuítas e Ana
Terra, do encontro dos dois nasce Pedro Terra. Ana Terra é obrigada a partir em
caravana, quando castelhanos invadem a fazenda da família, matam seu pai e
irmãos e a violentam, mas ela consegue esconder o filho, chegam então ao lugar
que mais tarde se tornaria a cidade de Santa Fé, onde se passa toda a trama. O
romance passa-se por várias gerações da família Terra, Cambará, Caré e Amaral,
Pedro Terra cresce e tem uma filha Bibiana Terra, que se casará com capitão
Rodrigo Cambará, moço muito bonito e galanteador, com espírito desbravador e
aventureiro, que morre em batalha.
O RETRATO -
No início do século XX, Licurgo Terra Cambará, e seus filhos Toríbio e Rodrigo
vivem no Sobrado, a casa mais bonita e famosa da cidade, o primeiro é homem
rude e ama o campo, já Rodrigo gosta de luxo e vai estudar medicina em Porto
Alegre, de onde volta com todas as novidades da época, como gramofone, vinhos,
conservas, etc. Vive em conflito com o pai que é homem conservador e não se
deixa seduzir pela sofisticação do mundo moderno. Rodrigo volta também com a
ideia de exercer a profissão, se casar, para esquecer a vida regada a mulheres
e muito dinheiro que teve na capital, quer se tornar “homem sério”, já seu
irmão Toríbio vive de aventuras. Rodrigo, bonito, vaidoso, e galanteador, mesmo
depois de casado continua a ter aventuras. No auge de sua mocidade, um amigo
seu espanhol, pinta seu retrato em tela gigante, que se torna sua uma espécie
de ponto de reflexão e comparação para Rodrigo, em todas as épocas de sua vida.
O ARQUIPÉLAGO -
Rodrigo passa por várias fazes em sua vida, após a morte da filha que mais
adorava Alicinha, ele larga o ofício de médico e vai para a carreira política,
onde se envolve em negociações não muito corretas, como troca de favores e
tráfico de influências. No final de sua vida ele já doente, e de cama, após um
ataque no coração, não encontra o apoio em sua família, sua esposa se quer
dirige-lhe a palavra, arrasada e machucada após as várias aventuras do marido,
seus filhos não o admiram e não concordam com seu tipo de vida, e estão mais
interessados na herança. A história passa a ser contada sob o ponto de vista de
Floriano, filho de Rodrigo, que representa o lado oposto do pai, reflexivo e
tímido, vive o trauma de nunca ter tido a admiração do pai, pelo fato de ter se
acovardado na frente de um campo de batalha. Fato que rebaixava o rapaz, por
ter tido em seus antepassados grandes guerreiros, e todos morridos em combate.
E também sob o ponto de vista de Silvia, agregada da família, que tem um amor
platônico por Floriano, mas acaba se casando com seu irmão, por conveniência,
os dois tem uma vida infeliz e vazia, e Silvia não consegue engravidar, para
desgosto de todos.
O romance acaba com a morte de Rodrigo e o fim de toda
aquela geração, que já não seguiriam os passos do pai. Encontramos nesta obra,
romance, aventura e análises psicológicas profundas que segundo informações são
os questionamentos do autor diante de seus conflitos com a família e a própria
vida, no final o abraço entre Rodrigo e Floriano, representa o perdão do
próprio Érico ao pai e a si mesmo.
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